quarta-feira, 25 de novembro de 2020

Rosa Alice Branco | Poema

 Quando a tua mão acaricia a minha perna

os sensores da pele desencadeiam reacções sentimentais
e às vezes chego a ter uma reacção motora.
O ângulo da perna, a inclinação do pé –
maravilhas-te com a paisagem ocasional:
depois da curva da estrada
estabilizas o olhar na curva do joelho.
Os olhos impacientam-se em sacudidelas invisíveis
mas o espelho reflecte apenas imobilidade.
A sandália: o teu olhar vai do joelho à nudez do pé.
Este pé que calcorreia as ruas é também objecto de desejo:
Este pé que calca o travão a fundo.
Sei que vais beijar-me – talvez nem tu saibas
que a postura do teu corpo tem o formato de beijo.
A carícia necessita de um encontro minucioso,
da pressão exacta para que não me esmagues a rótula.
O contacto é doce na pele que te ofereço,
a carícia é a obra-prima da engenharia mecânica.
Olho a baía onde se reflectem os néons da noite
e deixo o corpo trabalhar à vontade.
Depois adormeço com a tua mão na minha perna
e a vaga consciência de que o paraíso se estende
da ponta dos pés até ao cimo da cabeça.

Rosa Alice Branco

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